NO DIA EM QUE O GATO
FALOU
(Millôr Fernandes)
Era uma
vez uma dama gentil e senil que tinha um gato siamês. Gato de raça, de bom-tom,
de filiação, de ânimo cristão. Lindo gato, gato terno, amigo, pertencente a uma
classe quase extinta de antigos deuses egípcios. Este gato só faltava
falar. Manso e inteligente, seu olhar
era humano. Mas
falar não falava. E sua dona, triste, todo dia passava uma ou duas horas,
repetindo sílabas e palavras para ele na esperança de que um dia aquela
inteligência que via em seu olhar explodisse em sons compreensivos e claros.
Mas, nada!
A dama gentil e senil era, naturalmente, incapaz de compreender o
fenômeno. Tanto mais que ali mesmo à sua frente, preso a um poleiro de ferro,
estava um outro ser, também animal, inferior até ao gato, pois era somente uma
pobre ave, mas que falava! Falava mesmo, muito mais do que devia. Um papagaio,
que falava pelas tripas do Judas. Curiosa natureza, pensava a mulher,
que fazia um gato quase humano, sem fala, e um papagaio cretino
mas parlapatão. E quanto mais meditava mais
tempo gastava com o gato no colo, tentando métodos, repetindo silabas,
redobrando cuidados para ver se conseguia que seu miado virasse fala.
Exatamente
no dia 16 de maio de 1958 foi que teve a ideia genial. Quando a ideia iluminou
seu cérebro, veio acompanhada da critica, auto-crítica: “Mas, como não me
ocorreu isso antes?” O papagaio viu no brilho do olhar da dona o seu (dele)
terrível destino e tentou escapar, mas estava preso.Foi morto, depenado e
cozinhado em menos de uma hora. Pois o raciocínio da mulher era lógico e científico:
se 25. desse ao gato o papagaio como alimentação,
não era evidente que o gato começaria a falar? Era? Não era?
Veria. O gato, a princípio, não quis comer o companheiro. Temendo ver fracassado o
seu experimento científico, a dama gentil e senil procurou forçá-lo. Não
conseguindo que o gato comesse o papagaio, bateu-lhe mesmo – horror! – pela
primeira vez. Mas o gato se recusou. Duas horas depois, porém, vencido pela
fome, aproximou-se do prato e engoliu o papagaio todo. Imediatamente subiu-lhe
uma ânsia do estômago, ele olhou para a dona e, enquanto esta chorava de
alegria, começou a gritar (num tom meio currupaco, meio miau-miau-miau, mas
perfeitamente compreensível):
– Madame, foge pelo amor de Deus! Foge,
madame, que o prédio vai cair!
A mulher, tremendo de emoção e alegria,
chorando e rindo, pôs-se a gritar por sua vez.
– Vejam, vejam, meu gatinho fala! Milagre!
Fala o meu gatinho!
Mas o gato, fugindo ao seu abraço, saltou
para a janela e gritou de novo: – Foge, madame, que o prédio vai cair! Madame,
foge! – e pulou para a rua.
Nesse momento, com um estrondo monstruoso, o
prédio inteiro veio abaixo,sepultando a dama gentil e senil em meio aos
seus escombros.
O gato, escondido melancolicamente num
terreno baldio, ficou vendo o tumulto diante do desastre e comentou apenas, com
um gato mais pobre que passava: – Veja só que cretina. Passou a vida inteira
para fazer eu falar e no momento em que falei, não me prestou a mínima atenção.
MORAL: O mal do artista é não acreditar na
própria criação.
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Marque com um X o sinônimo das palavras ou
expressões em destaque:
1 - Em: ”… gato de raça, de bom-tom…”,
a expressão em destaque refere-se à pessoa que é:
A ( )
rica B ( )
bondosa C ( )
fina D ( )
natural
2 - A frase: “Este gato só faltava
falar” tem o mesmo significado que:
A ( ) Este gato, quando fica só,
tenta falar.
B ( ) Falar é só o que falta a
este gato.
C ( ) Só este gato é que falta
falar.
D ( ) Só este gato é que tenta
falar.
3 - Em: “Manso e inteligente, seu olhar era humano”,
a palavra em destaque significa:
A ( ) próprio do
homem
B ( ) bondoso
C ( ) submisso
D ( ) que ama os seus semelhantes
4 - Em: “Curiosa natureza,
pensava a mulher…” a palavra em destaque tem o mesmo significado que em:
A ( ) Vive arranjando confusões
de toda a natureza.
B ( ) Ele contemplava a natureza
com olhos de artista.
C ( ) Aquele rapaz tem péssima
natureza.
D ( ) Conservava, aos quarenta
anos, todas as boas qualidades de sua natureza.
5 - Em: “…e um papagaio cretino
mas parlapatão…” a expressão em destaque indica que o papagaio era:
A ( ) pouco inteligente mas muito
falante
B ( ) meio amalucado mas bonachão
C ( ) pouco instruído mas muito
observador
D ( )
Nenhuma das alternativas
6 - Em: “E quanto mais meditava mais
tempo gastava…” a palavra em destaque significa:
A ( )
planejava B ( )
pensava C
( ) examinava D ( )
estudava
7 - Relacione as colunas de modo a fazer a
correspondência entre as palavras que se seguem, formadas por auto e
sua significação.
1. ( )
autocrítica
a. vida de um indivíduo escrita por ele mesmo
2. ( )
autopunição
b. crítica feita por alguém a si mesmo
3. ( ) autobiografia
c. avaliação feita por um indivíduo para
provar a ele próprio que sabe determinados conhecimentos
4. ( ) automóvel
d. Veículo que se locomove por
seus próprios meios
5. ( ) auto - retrato
e. castigo imposto por um
indivíduo a si mesmo
6. ( ) auto - avaliação
f. retrato de um indivíduo feito por ele mesmo
8 - Em: “Temendo ver fracassado o
seu experimento científico…” a palavra em destaque significa:
A ( ) quebrado
B ( ) reduzido a pedaços
C ( )
mal-acabado
D ( ) malsucedido
9 - Em: “…sepultando a
dama gentil…” a palavra em destaque significa:
A ( )
escondendo
B ( ) isolando
C ( ) soterrando
D ( ) abrigando
10 - Em: “…em meio aos escombros…”
a palavra em destaque significa:
A ( ) restos de construção
desmoronados
B ( ) cinzas resultantes de um
incêndio
C ( ) ruídos provocados por um
desmoronamento
D ( ) substâncias venenosas
11 - Em: “O gato, escondido melancolicamente num
terreno baldio…” a palavra em destaque significa:
A ( )
assustadoramente
B ( ) tristemente
C ( )
nervosamente
D ( ) timidamente
Assinale a alternativa correta, de acordo com
o texto.
12 - São características da dama:
A ( ) bondade, simpatia e
inteligência
B ( ) coragem, simpatia e
desenvoltura
C ( ) persistência, teimosia e
velhice
D ( )
Nenhuma das alternativas
13 - O gato da dama é apresentado como sendo
um animal:
A ( ) bonito, terno, amigo, de
boa raça e inteligente
B ( ) bonito, inteligente,
pacífico e preguiçoso
C ( ) terno, amigo, raro e
preguiçoso
D ( ) bonito, terno, corajoso e
inteligente
14 - O fenômeno que a dama não conseguia
compreender era:
A ( ) a burrice do gato
B ( ) a mudez do papagaio
C ( ) a inteligência do
papagaio
D ( ) a mudez do gato
15 - O papagaio percebeu o que estava para
acontecer-lhe quando:
A ( ) olhou para a sua
dona
B ( ) escutou o que sua dona
dizia
C ( ) aproximou-se do
gato
D ( ) já estava para ser morto
16 - Ao ter a ideia genial, a dama sentiu-se:
A
(
) arrependida por ter que sacrificar a ave
B ( ) satisfeita e recompensada
C ( ) pesarosa pelo fato de a
ideia não lhe ter ocorrido antes
D ( ) temerosa de não estar certa
17 - A operação que envolve a morte do
papagaio até a ingestão do alimento por parte do gato durou aproximadamente:
A ( ) 1
hora B ( ) 2
horas C ( ) 3 horas
D ( ) 24 horas
Responda com suas palavras:
18 - Quanto tempo era gasto diariamente pela
dama com os métodos de ensino ao gato?
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19 - Quando foi que ocorreu à dama a fórmula
que lhe pareceu adequada para fazer com que o gato falasse?
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GABARITO
1. c 2.
B 3. A 4.
B 5. A 6.
B
7. A seqüência é: b, e, a, d,
f, c 8. D 9. C
10. a 11.
B 12. C 13.
A 14. D 15.
A 16. C 17. C
18. Todo dia a dama gastava uma a
duas horas tentando ensinar o gato a falar.
19. Exatamente no dia 16 de maio de
1958.
Fonte: http://portugues.camerapro.com.br
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